sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

Carta às minhas "grandes" histórias de amor

Eu cresci vendo grandes histórias de amor. Talvez não tão grandes (as que li tanto nos livros da adolescência), mas sempre fui uma romântica nata pelas grandes histórias de amor. Cresci vendo pais que estavam sempre juntos (e sem saber dos perrengues que podiam existir - e certeza que existiam. Qual vida adulta não tem mil e um perrengues?) e por isso busquei sempre minha grande história de amor. Talvez esse fosse o erro: buscar a história de amor. Grandes histórias nos encontram, batem na nossa porta (ou, até mesmo, arrombam nossa porta, nossos corações, e nos fazem engolir goela abaixo aquilo) e simplesmente acontecem. 


Aos 10 anos ganhei meu primeiro "Diário da Princesa": uma história misto de descobertas na vida de uma adolescente com o início de uma história de amor. No segundo livro, quando a história romântica se concretiza de fato, me lembro de chorar como se fosse comigo. Meu coração pulsava, quase saia pela boca, de tanta emoção que aquilo me passava. E assim comecei a devorar livros (sejam quaisquer o assunto, mas os preferidos sempre foram os romances). Era - talvez - uma necessidade absurda de sempre reviver aquelas emoções dos protagonistas, de amores impossíveis e finais felizes completamente improváveis. A cabeça de uma pré-adolescente é uma coisa conturbada, definitivamente.


Só que eu cresci uma pessoa apaixonada pelo amor. E digo amor não só o sentido romantico da palavra, mas o amor de um modo geral. Eram músicas de amor/sofrimento amoroso (perdi as contas de quantas vezes cantei "Devolva-me" da Adriana Calcanhoto e sofri com aquele fim de relacionamento que nunca existiu), livros e mais livros, filmes (te desafio a encontrar uma comédia da década de 2000 não vista por mim ainda), mas a realidade se tornou algo tão diferente daquilo que eu sempre almejei e busquei. 


Chega a adolescência e a rebeldia me pegou com força (sim, já quis ser punk só por amar Legião Urbana e achar que era cool seguir os passos do Aborto Elétrico - a banda que deu origem ao Legião). O amor agora devia ser uma chacota, uma coisa de gente fraca, que não sabe o que quer. Eu sabia o que eu queria: queria mais uma paixão boba (eu tive tantas- platônicas - durante a infância/adolescência que nem sei quantas foram), queria o frio na barriga, queria aquele fim de livro da Meg Cabot, em que tudo é perfeito, que as pessoas são completamente opostas, mas são complementares. Ah, como era bom sonhar. Apesar de todos os problemas sociais/de autoestima que tive durante praticamente toda a vida, uma coisa que eu nunca deixei de me permitir foi de me apaixonar, de procurar um amor "desses de cinema". 


Só que a vida adulta real chegou. E ai começou um período de grande decadência. O fim da adolescência (vamos falar ai dos 18 anos, porque acho que até hoje, quase nos 30, ainda continuo uma adolescente) foi uma explosão de sentimentos incríveis, de um relacionamento real e utópico e, poucos anos depois, motivo para chorar com minha amada MPB. Minha avó que o diga, que fala que eu cantava sofrido, de coração partido (lembrando que já é sofrido ouvir eu cantando, imagina de coração partido). Mas assim foi: a primeira queda do cavalo, violenta, com sequelas a longo prazo. Quando a gente é jovem, sente as coisas numa intensidade que hoje vejo que de saudável só tinha a cara de romances dos filmes. Foi então que comecei um longo, tortuoso, dificil e demorado caminho em busca de amor próprio.


É engraçado pensar, a essa altura do campeonato, que apenas comecei a me preocupar com o amor mais importante de todos quando uma paixão me fez quebrar a cara. Me vi em um momento, quebrada em mil pedaços, mas (hoje vejo isso né) com a oportunidade de colar esses pedaços da forma que eu quisesse. E foram longos anos de terapia. Uma coisa que é triste desse momento, além da desesperança no amor romântico, foi o fato de eu ter parado de ler. Ver que aqueles amores dos livros, aquelas paixões, as faíscas, não eram pra mim, me doeu pra caralho. Doeu a ponto de parecer que tinha levado um soco no estômago. E ai veio as partes que os livros e filmes não mostram.


Hoje em dia até que temos mais "exemplos" na indústria do entretenimento/arte de pessoas se rescontruindo após tomar no c*, mas naquela época veio a solidão, a busca por algo que entendesse minha dor e meu sofrimento. Pode parecer exagero isso, mas é literalmente o que eu sentia: sofrimento, dor. 


Desde então muita coisa mudou. Alguns amores passaram por mim, por minha história e nenhum arrancou pedaços mais. Um inclusive ficou e está ai até hoje. É um amor de cinema, que faz o estomago até doer só de ver a pessoa? Não. Mas como uma frase que vi hoje: que bom, isso quer dizer que te traz paz. Isso é o que se chama maturidade. (Inclusive, já escrevi sobre o amor calmo, então sem mais delongas)


Mas por que eu escrevo isso numa noite de quinta-feira? Porque acabei de ver mais uma série sobre amor. Estou na fase do vício completo por séries italianas, que guardam tanta coisa especial pra mim (quem me conhece, sabe do meu fascínio desde de muito nova pela Itália). E foi uma série que falou de tantos tipos de amores (inclusive de amores adolescentes, amor familiar e amor próprio). E trouxe de volta aquela Isabella apaixonada pelo amor, por amar. E veio só na minha cabeça: por que eu não faço mais coisas que amo? Por que valorizo tão pouco meu amor próprio em prol do amor alheio (vamos dar destaque as amizades, porque quem me conhece sabe que eu me doou mil %)? Então aqui estou eu, fazendo algo que amo (escrever), falando de algo que amo (o amor) e cogitando seriamente a escrever mil histórias de amor (me perdoe os que são cult, mas amo um clichê). Eu vivo minha história de amor real, que tem lá seus mil perrengues (como todas histórias de amor real. Não existe na vida real aquele amorzinho de livros, perfeito - até mesmo porque eu não sou esse personagem), mas acho que preciso de inventar mil histórias malucas, mirabolantes, irreais, para me sentir a Isabella de 10 anos, que passava todos os recreios da escola lendo sobre o amor.

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segunda-feira, 15 de novembro de 2021

Carta ao agora do antes

Você pode ser esse segundo se comparado ao segundo anterior. A todo momento, coexiste com o agora e o anterior. Mas, ao mesmo tempo, você é o daqui anos. E você tem me feito sofrer muito, querido futuro. 


Estranho escrever essas palavras sabendo que enquanto as escrevia, imaginava o meu eu milésimos de segundos mais velha lendo e me sentindo mais sábia (ou talvez mais velha só, não sei). O que eu sei, com toda a certeza do universo (e todos as suas derivações), é que eu tenho um constante medo do seu mistério. Somos seres dotados de uma capacidade linda, que é sonhar, mas com isso vem uma capacidade horrível, que é criar expectativas; e só, somente só, você, querido futuro, sabe se aquele plano vai ter êxito ou vai ser apenas uma frustração. 


Se engana quem acredita que não pensa em você: quando nós somos crianças, sempre pensamos o que vamos ser quando crescer, mas criança tem a liberdade poética (e da alma capitalista) de sonhar em vão. Adultos não. Nós, adultos (talvez me classifique como adolescência tardia), não podemos apenas sonhar, criar planos: nós devemos ter os dois pés no chão, fincados, colados, cimentados, nos impedindo de apenas voar com nossos desejos, porque, ao contrário do que acontece na infância, quando caímos, o tombo cobra caro; e é esse motivo de temermos tanto você, futuro. 


Apesar de necessário e certo, você querido agora de antes, nos traz uma sensação de medo, insegurança e (para os mais otimistas) esperança que nos impede de ousar como crianças, nos impede de ter o desejo de ser astronauta para ser contador (desculpe se ofendo, mas não consigo imaginar nada mais técnico e monótono). E isso é o que faz nós adultos sermos tão frustrados. "Nossa Isabella, mas não é sonhar que nos frusta?" E eu te respondo: de forma alguma. Nos frusta mantermos nessa posição de conforto, em amizades vazias mas presentes, em trabalhos monótonos mas existentes, em relacionamentos vazios mas existentes; é isso que faz a gente parar de sonhar e de acreditar: o comodismo pelo medo de não realizar os próprios sonhos, amado futuro. 


Se os antigos dizem "a morte é a nossa única certeza no futuro", eu digo que a morte começa quando abrimos mãos de quem somos e nos afundamos em um vazio existencial criado único e exclusivamente pelo medo do que podemos encontrar no caminho. Também não vou ser hipócrita de dizer que gosto quando as coisas saem completamente do script (até porque atualmente vivo esse cenário), mas se tem uma coisa que sei é que não somos quadrados para temer mais sua presença do que temer uma não vida. 


Me despeço, querido antigo novo amigo, deixando um ensinamento para o meu futuro eu (ensinamento que bem provavelmente caia por terra, mas que precisa ser dito): não tema o futuro, não tema o fim do túnel; não podemos afirmar que o que nos espera é melhor ou pior do que o que temos aqui e agora. E o que aqui e agora é a única coisa que realmente vale a pena, até porque cada segundo pode ser o nosso último segundo e cada segundo desperdiçado é um pedacinho de um futuro perdido. E ainda complemento, querido amigo, que não sabemos mesmo do que você nos guarda, até mesmo porque criamos tantas certezas no agora que você faz questão de destruir em segundos (e esses nunca são desperdiçados).

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segunda-feira, 8 de março de 2021

Carta ao meu eu: mulher

  Ser mulher é um ato de coragem.

Desde que eu me lembro por gente, eu me sinto mulher. Digo isso no conceito de mulher que eu construí dentro de mim, por meio de todos os exemplos que tive: mulher, pra mim, é, antes de mais nada, força; é conseguir carregar um mundo nas costas e mesmo assim passar por rasteiras o tempo inteiro. Não se engane ao pensar que não gosto de ser o meu eu mulher: eu amo! Amo ser esse tsunami de emoções, de razões e de explosões.

E hoje, dia 8 de março, é um dia bem sensível para o meu eu mulher. Eu te escrevo, cerne feminino do meu ser, para te dizer que eu entendo o que é passar o dia afundada em contradições: ao mesmo tempo que eu me identifico completamente com esse “título” biológico e de gênero, eu me sinto sem forças e frustrada. Estamos no século XXI, mais exatamente no ano 21 desse século, e mesmo assim me sinto vivendo no tempo das cavernas. Nossas lutas ainda soam ilegítimas aos ouvidos daqueles que não querem ouvir e nossas vontades parecem nulas para os que não querem ver. Ser mulher em 2021 é buscar reconhecimento, é buscar igualdade e buscar, acima de tudo, seu lugar no mundo.

Sei que esse texto tá pesado para o dia que representa, mas hoje, pela primeira vez, agradeci os “parabéns” pelo dia com um: hoje é só mais um dia de luta. Estar viva num país em que mata mulheres por serem mulheres e que tem governantes que expressam sua misoginia diariamente é uma vitória – uma triste vitória. Hoje, agora, me sinto cansada; parece que essa “brincadeira” de levar o mundo nas costas cansa.

E quando paro para analisar de onde vem essa força, só vem a minha mente tanta mulher que passou pelo pior para que eu pudesse, no mínimo, ter um pouco mais de conforto. Mas isso não é suficiente. E hoje, dia internacional da mulher, fica tudo tão evidente. As redes sociais potencializam e evidenciam tanto esse dia como puramente comercial e parece tirar tanto a importância do que é ser mulher, da potência que uma mulher tem. E isso, mesmo que eu me esforce que não, me entristece. E todos os dias eu consigo, na medida do possível, passar por cima disso e ser uma mulherão da porra (internamente), mas hoje ficou tudo muito cansativo.

Era pra ser um texto para o meu eu mulher. Acredito que essa parte seja a que eu tenha mais orgulho em mim. E essa parte também chama tantas outras mulheres incríveis, tantas outras almas que completam a minha forma de ser. No fundo, o meu eu mulher é quase que uma rocha, mas que tem um interior líquido que hoje só se derrama.

Que 2021 seja um ano para que o meu eu mulher cresça, lute, ensine e que em 2022, nessa mesma data, o interior líquido da rocha que eu sou esteja cada vez maior, mais forte, mais potente e mais ainda mulher.

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sábado, 18 de abril de 2020

Carta aos amores calmos


Um turbilhão de emoções: é isso que esperamos de um amor. Esperamos vê-lo do outro lado da rua, com uma áurea iluminada, anunciando que é o nosso amor. E ai vem uma novela mexicana: a busca incansável, as inúmeras frustrações e expectativas... É, todos nós vemos isso nos romances hollywoodianos. Mas e se não for sempre assim? E se a gente ir gostando aos pouquinhos e se apaixonando sem nem perceber e de repente simplesmente ser? E se eu te amar todos os dias um pouquinho mais, mas sem sentir aquela paixão avassaladora/destrutiva da adolescência? E se realmente você for o caminho, amor calmo?

Eu sou libriana. Isso já diz muito: conquistadora, mas muito romântica. Pulando a parte de conquistadora, eu sou muito romântica. Lembro do meu primeiro amor, logo na infância: era o meu oposto – agressivo e fazia bullying comigo (sem citar nomes, porque né). E eu acho, que depois de passar pelo terceiro “grande” amor da minha vida (porque durante a infância e adolescência aquele parece ser o amor da vida), eu achei que amar alguém deveria ser um tornado: chega chegando, destrói tudo e te deixa aos pedaços. Mas, nas idas e vindas do amor, eu me deparei com algo o oposto: algo que acalenta o coração, ao invés de destruir. No auge dos meus 25 anos, bem entre a suposta vida adulta (que eu ainda não enxergo), eu me deparei com 1 metro e 93 de puro amor. Mas esse amor que eu não esperava encontrar até te perceber na minha vida, calmaria.

Cresci lendo mil livros de romance (e ainda os leio compulsivamente, principalmente esses best sellers) e vendo filmes em que isso não existia: nunca víamos o depois, só a conquista. E acho que eu e muita gente por ai acreditamos que isso nem existia, esse amor que acalma o coração, te abraça enquanto dorme, te sorri com os olhos, te dá segurança sem te tirar do eixo antes. Não, não amo menos. É ainda mais amor. É duas vezes amor, na verdade: é aprender a amar o outro e amar a si mesma, porque você vê uma visão sua tão linda e única.

Eu não acreditava que você existia. Afinal, cadê o príncipe no cavalo branco? Ou o bonitão novo na cidade (vide Julia Quinn)? Nós esquecemos que amar é, antes de tudo, calmaria. É independência. É você se amar acima de tudo e ainda amar o outro e amar o que ele faz de você. É acordar e não se sentir ansiosa em ser perfeita para o outro, porque você já está segura do que você é. É rir sem moderação, é acordar descabelada, é sentir vontade de ter o outro ali (mesmo que apenas estejam juntos). É, no fim das contas, viver o que o amor de cinema/novela mexicana nos mostra, mas de uma forma muito mais feliz, mais calma.

Sei que falei muito e parece que você não sabia nada disso. Mas eu sei que você sabe. Eu sei, amor calmo, que todos os dias que eu acordo e te vejo e te sinto do meu lado, eu respiro o ar mais tranquila e sei que ali tenho uma família. Sei que as vezes nos desentendemos; afinal, ainda tem um pedaço enraizado em mim dessa menina que acreditava nos amores devastadores. Mas, apesar de todos os pesares, não trocaria nada do que você me proporciona por simplesmente precisar sentir possessão e medo (porque é isso, no fim das contas, que sentimos no caso dos amores tornados: medo de perder). Eu aproveito todos os dias, um por um, ao seu lado e quero, se puder, pedir pra você ficar sempre comigo. Não existe sensação melhor do que saber que tá tudo bem e que tem calmaria e tem amor e tem olhares bondosos.

Por isso, quero te agradecer. Quero agradecer ao universo a oportunidade de amar sempre e amar sem dores. Sei que nem sempre é fácil, mas estar na presença da sua calma me faz acreditar que posso escalar uma montanha e chegar no topo sorridente. E, por último, te desejo encontrar todos os corações desesperados por amar. Eu, que já fui um desses corações, acredito que todos merecem a chance de serem felizes com o outro e consigo mesmos em todos os momentos, principalmente na calmaria de um domingo de manhã, com um café bem quente na janela. Obrigada por ser.

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terça-feira, 16 de julho de 2019

Carta à saudade


“Eu tô com uma saudade apertada
Rubel

Sabe aquele sentimento que todo mundo tem pelo o menos uma vez na vida? Eu estou tendo uma vez por dia. É você, que parece andar junto com a distância e com a solidão, que traz fácil demais aos olhos lágrimas, que faz querer voltar no tempo. O coração anda apertado e você predomina nos meus dias atuais. Foi pra você que tantas músicas sertanejas foram escritas, cantadas e choradas. É você, saudade, que me causa angústia e por isso eu te escrevo hoje.

Quando resolvi abrir asas e partir num longo voo para “realizar um sonho”, não imaginava que com os 2100 km trariam tantas coisas: trouxe um novo sotaque, novas comidas, novas amizades, nova rotina, novos compromissos, novas responsabilidades, mas, acima de tudo, te trouxe para minha vida de uma maneira ‘devastadora’, saudade. Claro que não sou ingênua de achar que nada mudaria: afinal, a vida de todos continua.

No entanto, às vezes, tudo que a gente queria era que a sua presença não incomodasse tanto – não, incomodo é muito pouco: que não doesse tanto. Às vezes, o que queremos no fim do dia é nos sentirmos amados, confortáveis, bem, acolhidos... em casa. Sim, nosso lar está em nós mesmos, mas a similaridade com o ambiente, com as pessoas, com o cheiro, com tudo, nos aproxima de nós ainda mais.

É com você que eu tenho acordado todos os dias. E o mais engraçado é que muitas coisas ainda nem se foram pra eu sentir tanta falta. E aí que eu penso: é o sentimento de apego, de proteção, de identificação que nos faz parecer que perdemos algo antes mesmo disso sequer acontecer? É você achar um lar, um lugar no mundo, e parecer que o seu mundo está querendo ficar em outra órbita?

São muitas perguntas sem respostas; e até prefiro que seja assim: tentar responder coisas do futuro vão apenas dar saudade de coisas que nem aconteceram e todo esse sentimento vai atrapalhar viver o presente o máximo que puder. E, no fim das contas, no crepúsculo de cada dia, temos apenas o agora para viver.

Então, saudade, vim te escrever para que você realmente entenda que sei que está aqui. E você dói. Você tem a cara de Minas, dos meus pais, da minha família, dos meus queridos amigos; o cheiro da minha avó e do seu mingau de milho verde; a temperatura fria nessa época do ano; o som dos pássaros na casa dos meus pais e das risadas de todos que amam e que estão longe; o gosto da melhor comida do mundo e das padarias maravilhosas que só achei lá. Queria ter uma máquina de teletransporte para, no mínimo, abraçar todos que estão longe (e não só em Minas: tenho amigos espalhados por quase todo país) e sentir todo o amor e carinho que só eles podem me dar.

Estar longe é bom e necessário, mas você, saudade, as vezes deixa tudo como um doce diet: com um gostinho amargo no fim.

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domingo, 9 de dezembro de 2018

Carta à decepção


Quem nunca se decepcionou que atire a primeira pedra. Sei que essa não é a versão bíblica original, mas, definitivamente, é algo que me acompanhou muito nessa última semana. E sei que, assim como eu, muita gente esbarra em você, sem querer, por ai. E por isso, sentada no sofá passando muito calor, eu te escrevo, querida decepção, para ver se, pelo o menos, você possa amenizar toda a angústia que eu estou sentido.

Sabe quando você aposta todas as fichas em algo? Então, eu quase sempre sou assim. Loucamente intensa (culpa, talvez, do meu ascendente em escorpião), costumo me doar e corpo e alma para pessoas e para causas. Mas, querida amiga, esqueço que na vida, a grande maioria das vezes, reciprocidade é algo praticamente inexistente. E é ai que você entra.

Perdi as contas só esse ano de como me decepcionei com pessoas e situações. Como abracei pessoas, as chamei de amiga, levei para minha vida (e casa, algumas vezes), para no fim descobrir que era um sentimento completamente unilateral. E foi ai que você entrou em cena, decepção.

O que acontece, creio eu (em toda a minha ingenuidade), é que quando estamos em uma situação, criamos expectativas. Criamos momentos únicos que apenas existiram em nossa mente. E como não se sentir completamente decepcionado quando as coisas vão ao contrário do que espera? Como simplesmente podemos ligar o foda-se (desculpe-me a expressão) quando todo aquele edifício que construímos de repente desmorona? Como não sentir o coração espatifado em migalhas tão minúsculas? E como podemos voltar a acreditar que nem tudo será apenas decepção?

Primeiramente, não sei responder essas perguntas, amarga amiga. Até mesmo porque se soubesse não estaria aqui, agora, gastando palavras para perguntar-te. Mas uma coisa eu aprendi: a única espera válida é a da fila do supermercado (e a do terapeuta). Esperar das pessoas algo que eu criei é o maior fruto da sua presença. Quantas vezes não criei amizades, lealdades, relacionamentos e até famílias dentro de mim que, lá no fundo, não passavam de grandes erros e vazios? Essa mania estúpida e ingênua de me doar por inteiro para quase desconhecidos, por falar o que penso desmedidamente, é o que mais gera esse desconforto pela sua presença.

Segundo que, mesmo com 26 anos, eu ainda não aprendi a lidar com esse sentimento. Naturalmente justiceira (alô sol em libra), eu me sinto responsável por situações assim, mesmo quando elas não foram geradas por mim. Me responda: qual a minha responsabilidade, além de criar expectativa, em situações em que o outro simplesmente não era quem disse ser? Nenhuma, mas, mesmo assim, sinto uma culpa correndo, como se eu não fosse capaz de arrumar a situação e deixa-la exatamente como imaginei.

Terceiro e último que, apesar de sentir esse sentimento inexplicável me correndo por dentro, a sua presença, querida decepção, é algo obrigatório para qualquer ser humano. Quem nunca criou uma expectativa sequer em relação a nada e não foi frustrado, nem gente é. É inevitável criarmos planos perfeitos na nossa cabeça, pessoas incríveis e situações únicas, mas, infelizmente, não somos nós que mandamos no nosso destino e, por isso, você é tão presente na vida das pessoas em geral, querida decepção.

E, dessa vez, não venho com nenhum apelo até aqui. O apelo é muito mais uma coisa interna do que pedir para que você apareça menos ou, até mesmo, deixe de existir. Criar um cenário diferente daquele que existe para alimentar o “ego” é algo natural, até mesmo humano. Mas sei que sofrer da forma que eu sofro, apenas pela sua presença, vai me deixar louca, careca e deprimida. Infelizmente, é impossível prever o futuro e viver sem se arriscar é apenas sobreviver.

E também não sou sendo egoísta demais. Sei que trouxe a sua presença para a vida de pessoas. E lamento muito por isso, por ser falha e não conseguir suprir as expectativas alheias, mas, as vezes, é preciso focar em si e no seus próprios desejos. É difícil sentir que a outra pessoa está decepcionada com você mesmo, mas, assim como supero a sua presença (a duras penas), posso superar também ser o motivo de trazer você para a vida dos outros.

E nesse momento, para finalizar, digo apenas: até logo, odiosa amiga.

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sábado, 1 de dezembro de 2018

Do que eu me orgulho


Não é uma carta, mas é mais íntimo do que isso. Algo que foi para um aula de ética virou um mantra para os dias difíceis (como está ultimamente).


Desnudar a alma é difícil principalmente quando é para nós mesmos, por sermos ensinados uma falsa humildade, e o orgulho é uma das consequências disso.

Por isso, hoje, a coisa pela qual eu mais me orgulho é por ser livre. E não apenas livre como garantem as leis, mas ser livre de mim, das amarras sociais, dos padrões esdrúxulos, das relações tóxicas e do julgamento do outro em relação a mim e ao meu corpo. Falando nisso, tenho muito orgulho da minha cicatriz: não foi feita por mim, mas foi construída, com muito suor e em uma relação de amor e ódio, por mim durante a vida toda; o que era um motivo de repulsa para mim hoje é, acima do tudo, o que me faz ser quem sou.

Me orgulho da minha coragem, que nunca me permitiu cair, mesmo que a vida tivesse me empurrando com toda força.

Me orgulho de cada trauma que superei, cada tropeço que levei e que me fizeram muito melhor e mais forte.

Me orgulho da minha força e da minha determinação.

Me orgulho de ser a filha que sou, que, mesmo sendo a ovelha negra da família, tenho os melhores pais e irmã do mundo e transbordamos amor.

Me orgulho da amiga que sou e dos amigos verdadeiros que fiz.

Me orgulho de hoje conseguir escrever e mostrar ao mundo – hiperbolicamente – pelo meu blog, que é um projeto de amor e carinho em números binários.

Me orgulho por ter chegado aqui, na medicina, mesmo pensando que não era pra mim.

Me orgulho por conseguir chorar mesmo quando estou feliz e por me permitir ter sentimentos pelos outros – mesmo que essas pessoas sejam completos estranhos.

Me orgulho por ser declaradamente feminista e por não me importar mais com os olhares desinformados daqueles que não concordam.

Me orgulho pela minha culinária: é um motivo bobo, mas, pra mim, não existe forma maior de amor do que aquele contido na comida.
Me orgulho de cada batalha que venci, principalmente as internas; as vezes, o campo de guerra é a cabeça de um ansioso e só ele entende o que é travar batalhas constantes e intermináveis.

Me orgulho por ter aprendido a me perdoar e a ter o pleno entendimento de que, mesmo querendo abraçar o mundo, o mundo não irá me abraçar.

Por fim, me orgulho de ser quem eu sou: entre tantos tombos, erros e acertos, nada me faria me orgulhar mais do que eu ser o que sou.

E, no futuro, espero me orgulhar de mim mesma profissionalmente, seguindo a linha de pensamento que tenho hoje sobre o cuidar do outro e não da doença. Também, quero me orgulhar por me permitir amar de novo uma pessoa e deixar ela entrar para partilhar tudo o que a vida tenha para nos oferecer. Quero continuar me orgulhando do que eu sou simplesmente por ser.

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